terça-feira, 6 de agosto de 2013

O vazio na rede


Considerando o sucesso que a rede social obteve em mobilizar as últimas manifestações históricas no Brasil, e igualmente o poder em não conseguir estabelecer as diretrizes básicas ou correntes das ideias políticas - não acredito que haja posicionamentos apolíticos, ou sem ideais, ser apolítico já é uma escolha, um ideal - vale algumas observações sobre esse fenômeno da comunicação social.

Apesar de ser um veículo de comunicação mundial, público, ele só existe em função de uma ideia genial e de um empreendimento gigantesco particular. O facebook é uma ferramenta e, como toda ferramenta, há maneiras de se operar sendo umas mais eficientes que outras. Questões relacionadas à privacidade são em geral ignoradas por 90% dos usuários. Estão contidos nos termos de adesão que todo mundo sai clicando em "aceito" sem antes ler uma linha do que está escrito. Tudo bem que esses termos em geral são obrigatórios. Para além disso, há diversas opções de configuração que permitem ao usuário supostamente ter mais ou menos privacidade. Daí o primeiro exemplo de que a ferramenta tem seus caminhos para ser utilizada, melhor ou pior.

Um segundo ponto é que, hipoteticamente, partindo do pressuposto que os usuários estão atentos às primeiras questões aqui levantadas, as postagens, os compartilhamentos, as "curtidas" naturalmente criam uma seleção, escolhida pela própria rede do que irá aparecer para o usuário em questão. Ou seja, efetivamente, ela já não estabelece um contato de fato com o outro usuário operando desta forma seletiva. Isso é facilmente perceptível nos anúncios, escolhidos a partir desse mesmo tipo de personalização do usuário. A pergunta que fica nesse ponto é: Essa seleção é fruto de uma questão meramente binária, no sentido se o sujeito toma ou não toma cerveja "x" ela aparecerá para ele como anúncio? Ou será uma seleção que passa por uma orientação política, ideológica? Isso serviria tanto para os anúncios quanto para a seleção dos assuntos que mais aparecem na rede. Então, é bom tomar cuidado com essa tal liberdade aí estabelecida. Nesse sentido, veja a entrevista veiculada na Folha de São Paulo do ativista anti-facebook na Europa e que não deixa de usar a rede. ((entrevista com Max Schrems, estudante de direito em Viena)

Outro ponto é que diante de tanta articulação política - se comunicar é um ato inerentemente político - com certeza há muito de nada, um certo dadaísmo do narcisismo, do egoísmo e do individualismo. Isso não é relevante para a força de mobilização que a rede possui. Pelo contrário, essas pseudo manifestações do nada, como fotos de momentos pessoais em momentos felizes, enfraquecem consideravelmente a rede no sentido amplo da palavra. Explico: Rede só é rede se acessada e se a informação ali contida gera alguma repercussão no sentido da ação ou informação fática. Momentos pessoais estão mais para um big brother social autopromovido. 

Caberia então ao usuário, atento ao uso da ferramenta, explorando seu uso de forma a dinamizá-lo, escolher o que o interessa na rede. É claro compartilhamento de momentos pessoais são válidos e até necessários nessa selva urbana tão populosa mas ao mesmo tempo tão solitária. Mas o fato é que quando tratamos da força de mobilização de uma rede para as pessoas irem às ruas manifestarem-se é necessário atentar para esses detalhes.

Por fim, muito dessas manifestações impulsionadas pela rede social, e tendo nela a principal ferramenta de mobilização, tiveram também muito de nada, de oba oba e festejo sem sentido. Uma reunião de desejos e anseios diversos, antagônicos, muito mais impulsionados pelo evento esportivo que o Brasil sediava no momento do que de fato uma mobilização conseguida pela força da articulação em rede. Tanto é que o momento passou e a coisa acalmou. E nas redes as manifestações continuam por parte de quem ainda acha que há muito a conquistar e a protestar. Ou seja, quem de fato se mobilizou pela força da ferramenta da rede continua mobilizado.  

Essas observações levam a concluir que são poucos os usuários que utilizam a rede de forma efetiva, que conseguem de fato fazer girar informações e consolidá-las nem que seja como formação de opinião. E a grande maioria, como de praxe, continua vagando num big brother existencial de autopromoção de uma pseudo e forçada felicidade. E isso não será um fato que mudará da noite pro dia. Isso é só pra quem tiver interesse e disponibilidade. Não é pra qualquer um.

A rede não tem todo esse poder de mobilização ainda. Particularmente torço para que qualquer ferramenta pública de comunicação possa atingir esse objetivo. A rede está aí para ser usada e há como tirar melhor proveito disso. Enquanto isso esperaremos a Copa do mundo para ver multidões lutando por direitos nas ruas de novo? Espero que não.

Leonardo S. Faria
leozleo@gmail.com
   

4 comentários:

Anônimo disse...

compartilhado! bom pra pensar...

Anônimo disse...

Texto muito claro e bem escrito. E mais importante, pertinente.

Anônimo disse...

espero que quem leia se toque de alguma coisa. Boa ferramenta pra ser desperdiçada desse jeito

Anônimo disse...

Muito sensato.
O perigo maior da rede, a meu ver, é que usuários de orientação política radical tenham sucesso na disseminação de ideais retrógrados e obsoletos. Muitos dos que utilizam a rede decidem compartilhar informações, idéias e propostas com base apenas nas primeiras linhas da descrição de uma página, sem senso crítico do que aquele compartilhamento significa em termos filosóficos. Como qualquer ferramenta, sua utilidade é tão boa quanto o uso que lhe é dado; e a prioridade funcional da ferramenta em questão tem sido a promoção ilusória da auto-imagem e da imagem perante os "amigos".
Vi isso há poucas semanas: um integralista (como declarado em seu próprio perfil) convocou greve geral como forma de protesto contra os "valore familiares distorcidos pelos últimos governos". Dezenas de milhares "curtiram" e compartilharam a iniciativa, sem se darem conta de que o objetivo era nefasto.
Poderia-se averiguar a natureza da proposta com poucos minutos de investigação sobre o perfil do usuário que propôs a greve -constavam fotos e citações de cunho integralista, mas o perfil foi apagado - entretanto, as pessoas preferem gastar estes minutos carregando e postando fotos de refeições...
Anauê! Só que não...