terça-feira, 2 de julho de 2013

Revolução na minha rua


O campeão voltou e o gigante parece que vai voltar a dormir. Depois de quase um mês de agitações fervorosas, manifestações pacíficas, em geral com meia dúzia de pessoas quebrando o pau, o Brasil, time de futebol, é campeão. Quanto ao Brasil nação, continuam  os preparativos para montagem de um time digno de ser campeão em algum quesito, por exemplo educação.

Passado o momento de euforia, o que esperar de tal situação? Agora não tem copa, não tem Fifa, não tem seleção nem mídia estrangeira. 

Inocente afirmar que essas manifestações foram espontâneas. O evento esportivo que o Brasil sediou com sua grandeza internacional é sem dúvida o estopim que levou os manifestantes a saírem de suas poltronas. Catalizou insatisfações históricas do brasileiro com a precariedade dos serviços públicos essenciais como saúde e educação, segurança pública e principalmente o descaso e desrespeito dos governantes com o cidadão.

Não são anos nem décadas apenas, são séculos de descaso e de falta de respeito com a população. A distância dos políticos é enorme. Basta ver Brasília. É o grande símbolo da distância que os homens do poder estabeleceram com seus vassalos.

O povo foi às ruas, percebeu seu poder de parar a vida de todo mundo, pensaram em greves gerais, sonharam mundos melhores. Fizeram fotos: Os revolucionários!  Burgueses, barbudos comunistas e desdentados, todos juntos. Cartazes demonstravam os diversos anseios, diversos quereres. Sentiram o poder de serem ouvidos, vistos. Sentiram o poder do povo unido. 

O povo se uniu nas ruas e para além do senso comum de que estão todos prejudicados, roubados, seus anseios são diversos e até contraditórios. Só para demonstrar: A classe média diz que seu ônus é maior, e que além de pagarem os altos impostos, bancam essas tais "bolsas miséria". Já os beneficiários destas bolsas acham que ainda é pouco o que recebem ante ao total descaso do poder público. Escolas de baixíssimo nível, professores mal pagos, sistema de saúde deplorável, moradias em locais irregulares, sem saneamento básico. O aparelho estatal mais presente para eles é o policial. Em tudo que fazem (beber, comer, andar de ônibus...) pagam o mesmo que a classe média, pois os impostos que sobrecarregam os brasileiros estão até na balinha da esquina. 

Estarão mesmo, interesses tão antagônicos e contraditórios, atados aos mandos e desmandos dessa classe política nada representativa? Será mesmo o caminho do voto a única solução?

O desgaste do sistema político com seus partidos obsoletos, as restrições à candidaturas ligadas ao poder aquisitivo e financeiro não mais convencem. A população assistiu ao erguimento de 15 estádios de primeiro mundo no prazo recorde de pouco menos de dois anos. Será mesmo tão difícil fazer isso com escolas e hospitais? 

A nação ao menos tem que tirar uma lição disso tudo. A política não pode estar em Brasília a 1200 km de distância. Nem mesmo restrita às câmaras de vereadores ou assembleias legislativas. A lição é que não se pode esquecer que somos essencialmente animais. Diferentes dos outros por conta de que, além de possuir os polegares opositores, somos políticos por natureza. Em cada gesto ou contato social somos políticos. Não podemos olhar para aqueles seres engravatados nas tribunas e achar que são marcianos. 

A política começa com seu vizinho, na sua rua, seu bairro. Ninguém pode decidir melhor os rumos de uma rua ou de um bairro do que seus próprios moradores. Para isso, existem as associações comunitárias, conselhos locais e regionais de assistência social entre outros aparelhos políticos. Além disso, nada impede que se criem novas associações ou entidades do tipo. Quanto mais os moradores são participativos nessas redes mais elas têm força política de decisão. 

A sociedade é naturalmente uma complexidade de anseios individuais reunidos, antagônicos, paradoxais. O maior desafio é abandonar os valores individuais egoístas e estabelecer o que mais se aproxima de um bem comum. Isso parece óbvio mas está longe de estar consolidado. E quanto mais relegar essa função aos marcianos do poder mais distante de uma realidade plausível, local, palpável estaremos.            

Leonardo S. Faria

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